Era
escuro, a noite negra de indiferença, adormecida no nada de uma avenida sem
fim. Sentia-se o aroma irritante de um elemento desconhecido, talvez mijo de
gato, ou quem sabe, de humanos que sem qualquer pudor, com alguma dificuldade
em controlar o seu corpo, não hesitaram em aliviar o de mais sofrimento. A
música surda de sons inexistentes, mas que existem no nosso imaginário -
conseguimos, então, ouvir o nosso inibido pensamento. A voz do cérebro impõe-se
perante nós, perante todo o nosso corpo físico, perante a nossa visão, como que
sem explicação falasse para nós...e não éramos nós. E eu pergunto: quem seria?
Quem será tão mal educado e rude para invadir a nossa restrita consciência?
Quem entra em mim? Quem fala comigo? Serei eu? Quem sou eu?
Agosto,
na virtude do mês, num ano desinteressante como já há muitos permanecia; noite,
noite, a madrugada a caminho, e eu andando ligeiramente, por vezes, um pouco
lento quando algo me intrigava por mais inútil que fosse, pelas ruas, e que
ruas? Porque nada me interessava, o sítio não me interessava, os carros não me
interessavam, ninguém me interessava, eu não me interessava por mim, a vida não
me interessava naquele momento. O momento era, incompreensivelmente não meu e
pouco existente. No fundo, sei que aqueles minutos intemporais foram nada,
foram pertencentes a uma alma desconhecida de alguém que não conheço. Sim,
desconhecia e desconheço qual a alma que me fala ao ouvido directamente para a
minha camada cinzenta dentro de mim criada pelo meu inconsciente. No entanto,
tudo fazia sentido mas nada era racional.
Perante
isto, hoje questiono-me se vale a pena questionar-me. Sei que cada vez menos
sei, por isso, para quê compreender o que não se compreende? Hoje, as
diferenças e as semelhanças continuam, mas com menos clareza e, ao mesmo tempo
com mais sabedoria. A vida corre como numa maratona, há quem desista porque não
consegue prosseguir; há quem se arraste porque não tem coragem e a estupidez de
desistir; há quem se situe em último porque faz o que pode, é bravo e
persistente, mas é incapaz; há quem se deslumbre no primeiro posto, no entanto,
as surpresas e as desilusões acontecem, não controlamos o nosso corpo, nem em
sonhos a nossa vida; há, ainda, quem corra com prudência, mas sempre ao mesmo
nível, a bom nível rumo ao triunfo; há, por ultimo, quem participe na maratona
porque por coincidência lá foi parar, interrogando-se assim o que lá está a
fazer, o que faz com que ele corra. E, neste caso, normalmente, estes pensam
mais do que correm, teorizam mais do que agem, e então, não saem do mesmo
sítio, da mesma posição, da vida monótona e triste.
Neste último grupo de pessoas estou eu incluído.
Porquê, eu não sei! Sei, pois, que vejo em tudo o nada e no nada o tudo.
Tento-me revoltar mas não consigo, tento acordar mas num sono vivo...morto.
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